Esclarecendo o sentido da Ocupação no Paço das Artes
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Aos artistas da "Ocupação", ao pessoal do Coro e a todos que ainda se interessam por instituições culturais.
Caros,
Que bom que finalmente a discussão começa a tomar rumos interessantes.
A
proposta de "Ocupação" do Paço das Artes deve-se à necessidade que a
equipe do Paço e eu sentimos em nos posicionar frente a penúria que as
instituições culturais estão vivendo em nosso país. Não se trata apenas
de falta de verbas, mas sim, o que é mais grave, da ausência total de
políticas culturais públicas para o exercício pleno da arte
contemporânea.
A idéia de oferecer o Paço à "Ocupação" dos artistas
responde, de forma silenciosa, a uma situação lamentável em nosso meio:
de um lado as elites se impõem à cultura pelo exercício da plutocracia,
ou, pior ainda, como bem lembrou o jornalista Mário César Carvalho em
recente artigo "A morte do MASP", as nossas elites preferem pagar
R$8.000,00 por um terno a colaborarem ativamente com as instituições,
em crítica ao advento da Daslu. De outro lado, o circuito de arte
(artistas, curadores, produtores, instituições e mercado) parece pouco
atento a estas circunstâncias.
O Paço das Artes chega aos seus
35 anos com o perfil de programação definido e sistemático, mas ainda
assim sem verbas para novas programações, com um mobiliário mambembe,
funcionários apaixonados pelo seu trabalho, mas indecentemente pagos, e
sem verbas para poder continuar o trabalho de forma planejada pela
falta de manutenção do seu cotidiano - tal como reforma elétrica, de
cabeamento de rede, atualizações de computadores e linhas telefônicas
com funcionamento precário ou quase nulo. Poucos, a não ser nós mesmos
parecem se importar com a gravidade de tal situação.
Todos os
artistas que participam da "Ocupação" foram alertados com muita clareza
a respeito desses fatos. Discutimos até que não caberia a diretoria do
Paço das Artes encabeçar mobilizações a esse respeito, mas apenas dar
ao meio total ciência dos fatos e abertura à "Ocupação" e aos debates
que dela poderiam surgir.
Ao tentarmos tornar esses fatos
públicos, fomos surpreendidos com a omissão total da mídia impressa. Em
entrevista ao Estadão e a Folha enumerei pessoalmente os problemas
elencados e a razão de fazermos uma "celebração", hélas, com um
vernissage de espaço em branco, mas a imprensa mostrou-se surda, cega e
muda, limitando-se a publicar o tal do arroz-feijão, ou seja, apenas o
serviço.
O projeto da Ocupação pretende, isso sim, criar
oportunidade de encontros e trocas entre os interessados na
continuidade de uma instituição como essa, pois cabe a sociedade civil
e ao meio artístico lutar pelos seus interesses. Como temos visto em
nosso meio, o que é que está faltando?
Primeiro, a clareza de
discernirmos em que medida a ausência de instituições culturais
equipadas e aparatadas para suportar as demandas da contemporaneidade
nos beneficia ou prejudica. Incluem-se aí verbas para programações
completas (que pudessem subsidiar obras e cachês de artistas, para além
dos orçamentos normais de produção, exibição e difusão de mostras) e
manutenção básica dos espaços.
Segundo, falta a discussão profunda e livre de preconceitos entre as partes, acompanhada de análise realista da situação.
Terceiro,
a decisão pelo traçado de estratégias de ação. Ou deixar o processo a
deriva, já que nem mais a dimensão simbólica prevalece nas instituições
brasileiras.
Esse espaço de discussão - potencialmente
constelado no Paço das Artes durante seus 45 dias de Ocupação - poderá
ou não gerar resultados interessantes tanto em direções políticas,
quanto mercadológicas e culturais. Ou poderá revelar, mais uma vez, a
nossa inaptidão a nos mantermos vivos no sistema vigente e seu devir.
Quem
somos? Onde estamos? E para onde queremos ir de fato? Dependerá de
todos nós e da nossa inteligência para conduzirmos negociações e
estratégias. A conversa começa agora e sinceramente espero que seja
construtiva. Sugiro um primeiro encontro com data e hora marcada no
Paço das Artes. E aí, quando será?
Um abraço a todos,
Daniela Bousso
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