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Sunday, 3 de Julho de 2005

Ocupação do Paço das Artes

Comemorando seus 35 anos de existência, o Paço das Artes abre suas portas para uma ocupação de cerca de 70 artistas e 10 interventores, transformando-se em um grande espaço de experimentação. Os artistas estarão presentes durante cinco horas diárias produzindo suas obras, instalações, intervenções.


Cada artista estabelecerá seu projeto: poderá estar em sintonia ou não com o grupo, poderá prever ainda uma finalização com caráter expositivo, poderá deixar em aberto para o artista que irá ocupar o espaço no turno seguinte intervir na obra iniciada, poderá produzir trabalhos a partir da própria experiência de ocupação. A proposta é inteiramente livre.

Artistas participantes:

Adriana Peliano, Ana Amélia Genioli, Ana Teixeira, Augusto Citrângulo, Beth Moysés, Bruno Vilela, Caetano Dias, Camila Sposati, Canal Contemporâneo, Casa Blindada, Daniel Nogueira de Lima, Daniel Salum, Del Pilar Sallum, Diego Castro, Domitíla Coelho, Eduardo Verderame, Eide Feldon, Eva Castiel, Fábio Flaks, Fábio Torres, Fábio Tremonte, Fanny Feigenson, Fernanda Chieco, Geraldo Souza Dias, Giselle Beiguelman, Graciela Rodriguez, Helga Stein, Jean Pierre Isnard, Jorge Menna Barreto, Juliana Pikel, Jum Nakao, Kika Nicolela, Lali Krotoszynski, Lucila Meireles, Marcus Bastos, Marga Puntel, Mariana Lima, Mariana Meloni, Marina Reis, Marília Fernandes, Mídia Tática, Mirtes Marins, Neide Jallageas, Nino Cais, Niura Bellavinha, Oficina da Luz, Paulo D'Alessandro, Paulo Gaiad, Paulo Lima Buenoz, Paulo Telles, Patrícia Osses, Pedro Palhares, Rafael Marchetti, Raquel Kogan, Rachel Zuanon, Renata Padovan, Renato Dib, Regina Carmona, Regina Johas, Ricardo Hage, Ricardo Carioba, Ricardo Ruiz, Roger Barnabé, Sheila Mann Hara, Site Específico, Sonia Guggisberg, Teresa Viana, Vera Bighetti, Vera Martins, Vera Sanovicz e Walton Hoffmann.

Paço das Artes
Av. da Universidade I - Cidade Universitária (USP)
11 3814 4832 - terça a sexta, das 11h30 às 19h
Sábado e Domingo, das 12h30 às 17h.

Friday, 1 de Julho de 2005

SOBRE OCUPAÇÃO NO PAÇO
Daniel Manzione
13.06.2005


"Quando eu canto
Que se cuide
Quem não é meu irmão"

Baioque – Chico Buarque

Ocupar v. t. 1. Estar ou ficar na posse de. 2. Invadir, conquistar. 3.
Tomar ou encher (algum lugar no espaço). 4. Dar trabalho ou ocupação
a. P. 5. Dedicar-se a; cuidar de. Ocupação sf.; ocupante adj. E s2g.

Como todos sabem, presumo, a definição das palavras oriundas do dicionário, é apenas o porto seguro de onde as palavras saem/chegam, para se perpetuarem para outras gerações.

Ou seja, as palavras só estão vivas quando as pronunciamos e nos comunicamos socialmente. Ressemantizamos as palavras, atribuímos novas significações a elas, nos apropriamos ideologicamente delas, mesmo sem nos darmos conta, e às vezes, em atitudes levianas, nem prestamos atenção aos desserviços que prestamos.

Todos esses pressupostos citados acima é um assunto incrível, pertinente e profundo a ser debatido, mas não se trata disso que estou aqui para falar. O assunto que gostaria de tocar tangencialmente e aforismaticamente é o caso "Ocupação no Paço das Artes" (se esse é o nome que se deu a esse evento).

*

Ocupação é uma palavra que, tal como diz em uma das definições "aureliescas" significa "invadir, conquistar" "estar ou ficar de posse". Significados corroborados hoje em dia pela prática estratégica de diversos movimentos populares, tal como o MST, MTST, Comunas Urbanas, MSTC e outros.

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Práticas estratégicas e principalmente subversivas, pois tencionam o estado das coisas estabelecidas pela democracia liberal. Para dizer o português claro: A PROPRIEDADE PRIVADA.

*

Seus objetivos finais não estão aqui em discussão, mas somente os fatos políticos que estabelecem com o espetáculo capitalista, a mídia em geral e a opinião pública.
 
*

As ocupações partem do pressuposto de que existe alguém que domina legalmente determinado local, segundo a constituição liberal brasileira, mas que é de fundamental importância iniciar uma práxis que combata os pressupostos que legalizam a existência desses locais privados.

*

As ocupações legítimas são fatos fundamentais pois criam uma cultura da insubmissão anti-capitalista.

*

As falsas ocupações, tais como a realizada no Paço das Artes, só prestam um desserviço à prática de luta dos movimentos populares nacionais, pois reduzem o significado da palavra e a tornam socialmente inofensiva.

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INOFENSIVA E PELEGA

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Os Museus são instituições Públicas (de poder do Estado), Privadas (de poder do Capital) ou Mistas. Não é preciso fazer nenhum comentário sobre isso.

*

Museus (ainda discutível) e Galerias são Aparelhos Ideológicos do Capital

*

A ação oportunista do Paço das Artes, e a adesão leviana (é o que tento acreditar) por parte dos artistas é uma conjunção de forças sociais destrutiva para a continuidade das lutas anti-capitalistas e principalmente seu poder no imaginário social

*

O suposto ato de liberdade dos artistas, condensado nos trabalhos que realiza e ações que pratica, o torna um sujeito socialmente desestabilizador. A desestabilidade pode tender para um lado ou para o outro. A falta de consciência dos artistas de sua identidade classista/ideológica pode tornar o artista um sujeito perigoso. De que
lado você samba?

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A sociedade de Classes é uma sociedade integralmente e genuinamente ideológica. Se não tivermos consciência ideológica, numa perspectiva totalizante, dos atos que realizamos, podemos estar, como já disse anteriormente, prestando desserviços à superação do próprio sistema a que estamos submetidos.

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Estamos submetidos, ou nos submetemos.

*

O pensamento dialético é o único pensamento possível para se pensar a vida, a política, a sociedade e a arte (ou sua definitiva destruição) hoje em dia e desde 1848.

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Toda denúncia prenuncia um anúncio

*

Parafraseando Godard em sua fase Revolucionária: O problema central é que as pessoas que fazem política hoje não sabem muito bem o que é a Arte e não querem entender, pois acham que isso é somente perfumaria,
e as pessoas que se interessam por Arte, não sabem muito bem o que é a luta de classes e realmente o que são as lutas revolucionárias, deixando a cargo da Arte somente uma abordagem ideológico-humanista da
sociedade e de sua possível transformação.

*

Ninguém encontrará Debord, muito menos os situacionistas (coisa na moda hoje em dia) senão reencontrarem MARX e o sentido da TOTALIDADE.

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Como somente o pensamento dialético nos redime: Quem é culpado? O PAÇO das ARTES ou os ARTISTAS que estiveram por lá?

*

Definitivamente a palavra OCUPAÇÃO estava no local e na hora errada.

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ESTRANHA DORMÊNCIA: OCUPAÇÃO no PAÇO DAS ARTES

Flavia Vivacqua
14.06.2005

Depois de experiências como a do ACMSTC, em que 120 artistas se colocaram em ação, junto a Ocupação Prestes Maia, onde habitavam 2000 moradores do MSTC – Movimento Sem Teto do Centro, em novembro de 2003 e a Favela do Moinho, um ano depois... frente a vivência com os coletivos de arte, que se esforçam para manter uma produção autônoma e pública... fica difícil aceitar qualquer construção histórica cultural. Principalmente quando um espaço público como o Paço das Artes, na USP e uma quantidade enorme de provedores culturais, utilizam-se equivocada mente e no mínimo ingenuamente das questões que envolvem
uma Ocupação. Que sentido há nessa ocupação? Que sutil 'reality show' a cultura se coloca e com qual finalidade!? Comemorar os 35 anos do Paço das Artes ou os R$3,00 de entrada, que os
espaços públicos de cultura do Estado estão cobrando e que torna-se prática do Paço a partir desse evento?
Que estranha dormência impede os provedores de cultura, de reconhecerem e utilizarem as ferramentas que tem a mão? Por que o Paço da Artes e todos que estão envolvidos nesse evento, com a ideia de ocupação e com o reconhecimento da precariedade existente, imprimem esforços de mobilizar e organizar tanta gente, se utilizam do acesso a mídia que o meio cultural naturalmente tem... mas não realizam a ação em sua real potência transformadora? Por que não repensamos nossa situação e nossas ações diante dos problemas do sistema cultural de que fazemos parte? A construção deteriorada da historia, no caso a cultural, se dá nesses
momentos: quando fazemos vista grossa a questões que por terem uma dimensão social, parecem não estar diretamente relacionada a nós; ou quando iniciativas privadas, com interesse particular, ocupam o espaço
público com o discurso de inovação; ou ainda quando somos ludibriados com a espetacularização e nos doamos barato as suas promessas; ou ainda quando perdemos a chance de em um evento reconhecidamente
histórico, de nos mobilizamos verdadeiramente frente aos problemas culturais que nos soltam aos olhos e ouvidos.



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De: Patricia Canetti

15.06.2005


Flavia,

Os artistas foram chamados para ocupar o Paço das Artes num momento em que ele simplesmente fecharia as portas. As curadorias programadas haviam sido canceladas por falta de recursos e havia o agravante político da mudança da secretaria de Cultura que estava para acontecer. E porque não fechar, seria mais honesto, eficaz? Ou, quem sabe o governo podia gostar da idéia e alugava outro espaço para algum Banco Santos da vida ou alguma multinacional do entretenimento... Confesso que pensei ingenuamente que o nome Ocupação conectaria as pessoas a gravidade da situação ou pelo menos fariam elas se perguntar o porque de uma instituição pública dentro de uma universidade estar fazendo uso de um termo tão forte...

Acho que a ação com real potência transformadora está se dando agora com a Ocupação, quando estamos trocando idéias aqui e lá (soube que os textos do Coro foram impressos e colocados no blog low-tec - um enorme quadro-negro com giz e tachinha, que tem a heróica tarefa de conectar os dois espaços do Quebra). O tempo interno da Ocupação está delicioso, parece cidade do interior, temos tempo para prosearmos a vontade!
Só para o seu conhecimento, já que você não tem ido muito ao Paço, o ingresso começou a ser cobrado no início do ano, justamente devido a penúria financeira da instituição.

Aproveito para te dar uma notícia sobre um outro assunto. Amanhã temos no Rio uma reunião para escolha de representantes para um seminário sobre a câmara setorial de artes visuais que, devido a falta de interesse crônica da classe artista por políticas públicas, teve o seu processo paternalizado pela Funarte, que agora escolhe os grupos que vão escolher os seus representantes, formando assim um colégio eleitoral ao seu gosto.
Esse talvez tenha sido "um evento reconhecidamente histórico, que perdemos a chance de nos mobilizamos verdadeiramente frente aos problemas culturais que nos soltam aos olhos e ouvidos".

Abraço,

Patricia

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De: Ricardo Rosas
15.06.2005


Patrícia,

Dessa forma as coisas ficam mais claras. Ou seja, explicam-se certos pontos obscuros. Do jeito que parecia antes, era um uso realmente gratuito (eu diria até sarcástico) da palavra "ocupação", e sem dúvida inspirou mesmo revolta.

Se o que está acontecendo é na verdade a ameaça de fechar o Paço, a coisa muda de figura, e aqui nos vemos na mesma situação quando do fechamento da Casa das Rosas. A ação, então, se justifica, e o nome vira um adendo.

De qualquer forma, a indignação da maioria, seja da Flávia, minha ou de outros (estou falando mais por mim mesmo), deveria ser a mesma se a situação se repetisse em casos que não esse, pois toda "apropriação" de má fé de uma atitude que para os artistas envolve muito mais que pose ou estilo mas urgência de interferir numa realidade muitas vezes cruel, pede sempre uma resposta à altura, que subverta esse mesmo mecanismo indiferente de apropriação.
Abraços
Ricardo

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De: Alexandre Menossi
15.06.2005

ola a todos que recebem estes emails da rede coro (sei que sao muitos)

já que a ação de ocupação no paco das artes e sincera, proponho a todos os artistas interessados a se dirigir
ao paco e ocupa lo de forma desordenada, de forma que o debate possa acontecer lá dentro efetivamente, não
somente na internet. 

farei isto e chamarei todos meus amigos artistas para fazerem o mesmo.

que a arte se desamarre!

alexandre menossi

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De: Ricardo Rosas
15.06.2005

A ocupação literalmente se dá por que o Paço anda mal das pernas, em termos de grana. Coisa que eu não sabia. Nesse caso, a apropriação é perdoável, mas o fato foi divulgado nos releases para a imprensa? Que eu saiba, não. E isso realmente gerou mal-entendidos entre os artistas.

Outra coisa é que esta lista está literalmente rolando num blog-mural no Paço, mas foi pedida autorização a nós para esse uso? A sensação de "vigilância velada" não aconteceria se as coisas fossem mais transparentes.

Por outro lado, acho que esse debate, à parte quaisquer interpretações apressadas, é muito estimulante e vale para que se repense a questão de como coletivos podem estar sendo cooptados pela máquina publicitária e institucional sem se dar conta, como a mistura entretenimento e ação pode estar esvaziando o discurso crítico e permitindo essa cooptação, e como está patente a falta - esta sim mais revoltante que a apropriação indevida - de uma real intervenção em problemas ou situações pontuais quando necessário. Talvez seja esse um momento valioso para que discutamos se a mistura "arte, entretenimento e política" não pode estar sendo minada, por um lado, pela predominância de uma dessas partes, e por outro, pela falta de uma maior asserção em questões concretas e palpáveis.

Não será o "bunker" Daslu um caso muito mais escandaloso que um Paço precário de grana pedir a "invasão" de artistas para uma exposição?

Abraços

Ricardo

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De: Fábio Tremonte
15.06.2005

Ricardo,

é isso mesmo.
Me assusta ver uma guerra entre artistas, uma guerra não declarara, muitas vezes veladas, e na maor parte do tempo sem propósito.
Acredito q devamos nos engajar e lutar contra o que realmente é poder...Daslu...Mensalão...Fome...
Concordo contigo e aperto sua mão...
Fábio

Esclarecendo o sentido da Ocupação no Paço das Artes

Aos artistas da "Ocupação", ao pessoal do Coro e a todos que ainda se interessam por instituições culturais.

Caros,

Que bom que finalmente a discussão começa a tomar rumos interessantes.

A proposta de "Ocupação" do Paço das Artes deve-se à necessidade que a equipe do Paço e eu sentimos em nos posicionar frente a penúria que as instituições culturais estão vivendo em nosso país. Não se trata apenas de falta de verbas, mas sim, o que é mais grave, da ausência total de políticas culturais públicas para o exercício pleno da arte contemporânea.
A idéia de oferecer o Paço à "Ocupação" dos artistas responde, de forma silenciosa, a uma situação lamentável em nosso meio: de um lado as elites se impõem à cultura pelo exercício da plutocracia, ou, pior ainda, como bem lembrou o jornalista Mário César Carvalho em recente artigo "A morte do MASP", as nossas elites preferem pagar R$8.000,00 por um terno a colaborarem ativamente com as instituições, em crítica ao advento da Daslu. De outro lado, o circuito de arte (artistas, curadores, produtores, instituições e mercado) parece pouco atento a estas circunstâncias.

O Paço das Artes chega aos seus 35 anos com o perfil de programação definido e sistemático, mas ainda assim sem verbas para novas programações, com um mobiliário mambembe, funcionários apaixonados pelo seu trabalho, mas indecentemente pagos, e sem verbas para poder continuar o trabalho de forma planejada pela falta de manutenção do seu cotidiano - tal como reforma elétrica, de cabeamento de rede, atualizações de computadores e linhas telefônicas com funcionamento precário ou quase nulo. Poucos, a não ser nós mesmos parecem se importar com a gravidade de tal situação.

Todos os artistas que participam da "Ocupação" foram alertados com muita clareza a respeito desses fatos. Discutimos até que não caberia a diretoria do Paço das Artes encabeçar mobilizações a esse respeito, mas apenas dar ao meio total ciência dos fatos e abertura à "Ocupação" e aos debates que dela poderiam surgir.

Ao tentarmos tornar esses fatos públicos, fomos surpreendidos com a omissão total da mídia impressa. Em entrevista ao Estadão e a Folha enumerei pessoalmente os problemas elencados e a razão de fazermos uma "celebração", hélas, com um vernissage de espaço em branco, mas a imprensa mostrou-se surda, cega e muda, limitando-se a publicar o tal do arroz-feijão, ou seja, apenas o serviço.

O projeto da Ocupação pretende, isso sim, criar oportunidade de encontros e trocas entre os interessados na continuidade de uma instituição como essa, pois cabe a sociedade civil e ao meio artístico lutar pelos seus interesses. Como temos visto em nosso meio, o que é que está faltando?

Primeiro, a clareza de discernirmos em que medida a ausência de instituições culturais equipadas e aparatadas para suportar as demandas da contemporaneidade nos beneficia ou prejudica. Incluem-se aí verbas para programações completas (que pudessem subsidiar obras e cachês de artistas, para além dos orçamentos normais de produção, exibição e difusão de mostras) e manutenção básica dos espaços.

Segundo, falta a discussão profunda e livre de preconceitos entre as partes, acompanhada de análise realista da situação.
Terceiro, a decisão pelo traçado de estratégias de ação. Ou deixar o processo a deriva, já que nem mais a dimensão simbólica prevalece nas instituições brasileiras.

Esse espaço de discussão - potencialmente constelado no Paço das Artes durante seus 45 dias de Ocupação - poderá ou não gerar resultados interessantes tanto em direções políticas, quanto mercadológicas e culturais. Ou poderá revelar, mais uma vez, a nossa inaptidão a nos mantermos vivos no sistema vigente e seu devir.

Quem somos? Onde estamos? E para onde queremos ir de fato? Dependerá de todos nós e da nossa inteligência para conduzirmos negociações e estratégias. A conversa começa agora e sinceramente espero que seja construtiva. Sugiro um primeiro encontro com data e hora marcada no Paço das Artes. E aí, quando será?

Um abraço a todos,

Daniela Bousso

A morte do Masp

Mario Cesar Carvalho compara a ascensão da Daslu com o declínio do MASP e revela as contradições da oligarquia paulistana. Texto transcrito da Coluna "Folha Opinião" do Jornal Folha de São Paulo do dia 13 de junho de 2005.


O Masp (Museu de Arte de São Paulo) não recebeu nem um centavo de doadores privados neste ano. Talvez por isso sejam reveladoras as fotos em que Julio Neves, o presidente do museu, aparece sorrindo na inauguração da Daslu, cujo prédio foi projetado pelo arquiteto.

As fotos são reveladoras porque expõem cruamente o muro que separa os novos ricos do universo da arte: os que pagam R$ 4 mil por uma saia ou R$ 8 mil por um terno acham que não vale a pena dar um centavo para o Masp ou para qualquer outro museu.

A ascensão meteórica da Daslu e a morte lenta do Masp parecem fazer parte de um mesmo fenômeno: aquele em que a elite paulistana abandona completamente a esfera pública, o espaço de convívio com os diferentes, para se isolar em bunkers como o que abriga a Daslu.

Museus são um dos melhores indicadores da predisposição da elite para dividir um de seus bens mais valiosos: a arte. É por isso que o Brasil dos anos 70 assustava os artistas estrangeiros. Como pode um país tão pobre oferecer obras primas de Van Gogh, Cézane e Modigliani num prédio que é, ele próprio, um assombro modernista?

Esse país parece ter acabado. Desde outubro de 1994, quando derrotou José Mindlin por um voto (22 a 21), Neves promove um processo de desmonte do Masp. Trocou o piso, aposentou os cavaletes de vidro e concreto, levantou paredes e criou uma sala VIP. Por incrível que pareça, ninguém fez nada _o Patrimônio Histórico, o Ministério Público, os artistas, os colecionadores, os críticos. Neves extrai suas forças desse vácuo: há dez anos ele está na presidência do Masp.

Neves trata o prédio de Lina Bo Bardi (1914-1992) como se fosse mais uma obra dele. Não é por capricho que se quer manter os cavaletes de vidro e o piso básico do Masp. Eles narram as opções de Lina por um modernismo seco, sem adereços. Refletem as escolhas políticas da arquiteta. Lina era comunista e, no período mais negro da ditadura militar, em 1968, emprestava o canteiro de obras do Masp para Carlos Marighela, um dos guerrilheiros mais procurados, fazer reuniões da Aliança Libertadora Nacional.

Neves, amigo de infância de Paulo Maluf, não se contenta em desfigurar o museu. Quer colocá-lo à sombra de uma torre de 125 metros de altura projetada por ele. O próprio arquiteto apelidou o projeto com o inacreditável nome de 'pirocão'. A justificativa jeca para a altura é que do topo da torre daria para ver o mar em dias claros. A torre, na visão de Neves, ajudaria a levantar recursos para o Masp. O arquiteto não consegue mostrar decentemente o melhor acervo da América Latina e quer mostrar o mar? Na escala Neves, uma torre parece valer mais do que um Rafael ou um Ticiano.

Parece inacreditável, mas há tucanos lotados na administração do prefeito José Serra (PSDB) que apóiam a construção da torre. Não percebem, talvez, que o museu corre o risco de virar uma extensão dos negócios imobiliários de Neves. Essa história melancólica parece sinalizar o nascimento de uma nova era, na qual a elite privatiza bens públicos, como os museus, ou transforma-os em acessório de seus negócios. É o custo da ignorância, não dos pobres, mas dos que estão no topo da pirâmide econômica. Como não há mecenato no país, os museus viraram a casa da sogra.